O que é a cirurgia do manguito rotador e por que seus resultados variam?
A cirurgia para reparar o manguito rotador — grupo de tendões que estabiliza o ombro — é uma das mais realizadas na ortopedia moderna. Estima-se que, apenas nos Estados Unidos, sejam feitos mais de 250 mil procedimentos por ano.
Apesar de comum, o resultado nem sempre é previsível: alguns pacientes recuperam totalmente a função, enquanto outros sentem dor persistente ou sofrem uma re-rotura do tendão. Afinal, quais fatores influenciam o sucesso da cirurgia do manguito rotador?
O que dizem os estudos científicos sobre o resultado da cirurgia do ombro
Duas pesquisas importantes ajudam a entender melhor o tema. A primeira, publicada por Saccomanno et al. (2016), revisou 64 estudos e analisou diversos fatores prognósticos que afetam os resultados da cirurgia.
A segunda, de Gwark et al. (2018), comparou pacientes com mais e menos de 70 anos, buscando saber se a idade influencia a recuperação após o reparo artroscópico do manguito rotador.
Ambas chegaram à mesma conclusão:
a idade, isoladamente, não determina o sucesso da cirurgia,
mas sim o tamanho da lesão e a qualidade biológica do tendão.
Qual o papel da idade no resultado da cirurgia do manguito rotador?
Durante muito tempo, acreditou-se que pessoas idosas tinham piores resultados devido à menor regeneração dos tecidos e à presença de doenças crônicas, como osteoporose e diabetes.
O estudo coreano de Gwark e colaboradores testou essa hipótese comparando dois grupos: 53 pacientes com 70 anos ou mais e 159 com menos de 70, todos com lesões completas e submetidos à mesma técnica cirúrgica artroscópica. Os grupos foram pareados por sexo e tamanho da lesão, eliminando fatores de confusão.
O resultado foi claro:
as taxas de cicatrização, força e amplitude de movimento foram semelhantes entre jovens e idosos.
Conclusão: A idade não é uma barreira para bons resultados — o que realmente importa é o tamanho e o tipo da lesão.
Tamanho da lesão: o principal fator que influencia o resultado
Na revisão de Saccomanno et al., o fator mais fortemente associado ao insucesso cirúrgico foi o tamanho da ruptura. Lesões grandes ou múltiplas tendem a apresentar maior risco de re-rotura após o reparo.
A qualidade do tendão também é determinante: tecidos com infiltração gordurosa, retração e degeneração têm menor potencial de cicatrização. Além disso, procedimentos adicionais — como cirurgia do bíceps ou da articulação acromioclavicular — podem aumentar a chance de falha.
Em resumo: lesões pequenas e tecidos saudáveis favorecem o sucesso do tratamento.
Fatores humanos e psicológicos também afetam a recuperação
Nem só a anatomia importa. Saccomanno et al. destacaram que expectativas realistas, adesão à fisioterapia e engajamento na reabilitação influenciam diretamente a percepção de melhora.
Pacientes que compreendem o processo e seguem as recomendações médicas têm mais chances de se recuperar bem. Por outro lado, tabagismo, diabetes mal controlado e sedentarismo estão associados a piores resultados funcionais.
Além disso, o estudo observou que pacientes com ações trabalhistas ou indenizações tendem a relatar mais dor e menor satisfação — possivelmente por fatores emocionais e sociais ligados à recuperação.
Técnicas cirúrgicas e reabilitação: o que a evidência mostra
A reparação artroscópica — feita por pequenas incisões com o auxílio de uma câmera — tornou-se o padrão de tratamento. No entanto, não há consenso sobre qual técnica (simples, dupla ou em ponte) oferece melhores resultados a longo prazo.
Mais importante que a técnica é adequar o reparo ao tipo de lesão e ao perfil do paciente.
E, após a cirurgia, a
reabilitação é fundamental:
o fortalecimento gradual, a paciência e a fisioterapia orientada fazem toda a diferença para preservar o resultado obtido no centro cirúrgico.
Conclusão: o que realmente determina o sucesso da cirurgia do manguito rotador
A literatura médica é clara:
- Idade isolada não prejudica o resultado.
- Lesões grandes e degeneradas aumentam o risco de rerrotura.
- Fatores de saúde e estilo de vida, como diabetes e tabagismo, influenciam na cicatrização.
- Expectativas realistas e boa reabilitação melhoram a percepção de sucesso.
Em vez de perguntar “a cirurgia vai funcionar para a minha idade?”, a pergunta mais adequada seria: “meu tendão e meu corpo estão prontos para cicatrizar bem?”
Dicas práticas para melhorar a recuperação após a cirurgia do manguito rotador
- Converse com seu ortopedista sobre o tamanho e o tipo da sua lesão.
- Otimize sua saúde antes da cirurgia: controle glicemia, pare de fumar e mantenha uma dieta equilibrada.
- Respeite o tempo de imobilização e fisioterapia. O retorno precoce pode comprometer o reparo.
- Evite comparações com outros pacientes: cada ombro tem um histórico diferente.
- Mantenha o acompanhamento médico e fisioterapêutico. Pequenos ajustes no tratamento fazem diferença.
Fontes:
Saccomanno M.F. et al. (2016), Knee Surg Sports Traumatol Arthrosc
Gwark J.Y. et al. (2018), Arthroscopy: The Journal of Arthroscopic and Related Surgery
Conheça o Profissional
Dr. Fernando Brandão de Andrade e Silva
CRM-SP: 112045
- Graduação em medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP).
- Especialista em cirurgia do ombro e cotovelo pelo Instituto de Ortopedia e Traumatologia do Hospital das Clínicas da FMUSP (IOT-HCFMUSP).
- Doutorado em Ortopedia pelo Departamento de Ortopedia e Traumatologia da FMUSP (DOT-FMUSP).
- Título de especialista pela Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia (SBOT).
- Título de especialista em cirurgia do ombro e cotovelo pela Sociedade Brasileira de Cirurgia do Ombro e Cotovelo (SBCOC).
- Médico do Grupo de Ombro e Cotovelo do Hospital da Clínicas da USP. Atuação na área de ensino e pesquisa.
- Dr Fernando atua no tratamento das lesões do ombro e cotovelo, há mais de 15 anos, e desenvolve pesquisas na área, no Departamento de Ortopedia da USP.













